Dados da Previdência Social, compilados pelo Smartlab, do Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas sobre a Saúde do Trabalhador (Diesat), apontam que mais de 2 milhões de brasileiros se afastaram do trabalho entre os anos de 2012 e 2022 por conta de problemas causados por transtornos mentais. O adoecimento psíquico e saúde do trabalhador foram discutidos durante seminário promovido pela Central Única dos Trabalhadores na Bahia, nesta quarta-feira (25), na sede do Sindprev. O encontro contou com a presença de médicos e enfermeiros do trabalho, além de psicólogos, advogados e outros especialistas no tema.
De acordo com a pesquisadora Patrícia Marafon, integrante do Diesat, que é psicóloga e mestre em Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó-SC, os dados possibilitam retratar o desafio de se relacionar o adoecimento mental relacionado ao trabalho. “E eles são muito mais evidentes nas mulheres, que correspondem a 66% das notificações pois a ela recai o excesso da jornada de trabalho, muitas vezes dupla, e com esse trabalho que não é reconhecido ou valorizado, o cuidado com a família, a casa, os idosos, as crianças. A faixa etária de maior ênfase ocorre entre 30 e 49 anos. É uma idade muito produtiva, então tem-se um impacto muito grande”, avalia.
Um dos agravantes para a evolução deste quadro, conforme os especialistas, foi a Reforma Trabalhista, sancionada em 2016. A nova legislação flexibilização ainda mais as contratações de trabalho, abrindo margens a diversos tipos e perdas de direitos.
Integrante do Sindicato dos Psicólogos de São Paulo, Federação Nacional dos Psicólogos e representante do segmento dos trabalhadores no Conselho Nacional de Saúde, Fernanda Magano, afirmou que diversos são os males que hoje acometem os trabalhadores e citou como principais problemas a ansiedade, síndrome de Burnout, depressão, transtornos pós-traumáticos, aumento do consumo de álcool e drogas e aumento do dos casos de suicídio, além dos efeitos pós-covid. A principal faixa afetada por esses problemas é a de pessoas com idade entre 30 e 49 anos.
Sueda Fortaleza, médica do Trabalho da Diretoria de Vigilância e Atenção à Saúde do Trabalhador na Bahia, lembra que no Estado, os problemas de saúde mental respondem por mais de 7% dos afastamentos do ambiente laboral. Segundo ela, o risco do adoecimento está na organização do trabalho, que é voltada para a produção em larga escala com elementos à exemplo de excesso de cobranças, metas elevadas que vão além da capacidade humana, dentre outros aspectos. “Precisamos pensar essa organização em termos de relações do trabalho. Assédio moral é um determinante do adoecimento e ele vai dos colegas, do chefe e da própria estratégia de gestão do trabalho. Há um assédio para produzir mais. Setores como o bancário têm assédio em cadeia, que vai do executivo para o gerente e deste para o que está abaixo no organograma das empresas”, disse.
Ela alerta que não se pode responsabilizar o trabalhador, pois essa responsabilidade está no ambiente laboral. “As pessoas muito comprometidas com o trabalho são as mais vulneráveis. Muitas vezes o adoecimento não é físico, mas uma somatização”, explica.
Os especialistas estão em consenso que é preciso montar uma rede de acolhimento e acreditam que a Previdência Social precisa ser mais efetiva na defesa dos trabalhadores e liberar dados estatísticos para às informações sejam democratizadas.
Burnout – A psicóloga Bianca Reis chamou a atenção para a síndrome que tem atingido os trabalhadores brasileiros. Segundo ela, a doença traz consigo uma redução significativa na produtividade dos profissionais e suas causas estão relacionadas à sobrecarga no trabalho, ao ambiente laboral tóxico e pode fazer com que as pessoas adquiram problemas físicos e psicológicos, além de alta propensão a doenças. “Geralmente, os fatores de risco são as cargas de trabalho excessiva, falha na rotina organizacional e falta de suporte social”, enumerou.
Para a especialista, é preciso que os trabalhadores estabeleçam um limite que equilibre a vida pessoal e profissional, invista em autocuidado, praticando atividades físicas e se auto proporcionando momentos de descanso, além de buscar apoio social e manter relacionamentos saudáveis.
A enfermeira Ana Carina Dunham pontuou que é preciso falar do adoecimento do trabalhador dentro do movimento sindical. “Me assusta ver que hoje as discussões de mesas de bar são sobre depressão e ansiedade”, conta. Segundo ela, as relações de trabalho, com assédios e cobranças e a falta de direitos e autonomia levam ao esgotamento individual.
Ela também criticou as terceirizações que ocasionam a precarização do trabalho.
O professor e advogado Carlos Freitas defendeu a implantação de uma rede de atendimento à Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde e disse que a iniciativa pode evitar que os profissionais ocupem os hospitais devido ao agravamento de doenças iniciadas a partir do ambiente de trabalho.
A advogada Priscila Arraes Bueno recomendou que os trabalhadores que tiverem sitomas de Burnout ou de qualquer adoecimento laboral procure uma assessoria jurídica para que esteja amparado pela lei. Ela ressalta que os profissionais mais vulneráveis ao adoecimento mental são policiais, profissionais de saúde, professores, entregadores, dentre outros.
Representante do INSS, Ygor de Jesus, disse que o órgão busca facilitar a vida do contribuinte e afirmou que é preciso aparelhar a sociedade de elementos que busquem assegurar os direitos do cidadão. “Nós precisamos do apoio do Movimento Sindical para poder ajudar o trabalhador”, afirmou.
O palestrante Eduardo Calliga falou sobre a importância de debater a saúde mental do trabalhador e se posicionou contra o estigma social contra as pessoas mentalmente abaladas.